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  • JCnet
    04/09/2011

    Sem pilotos, setor aéreo não decola
    Falta de política para formação de pilotos no Brasil poderá causar “apagão” em setor em expansão e emperrar estrutura
    Ricardo Santana

    “Dasapertem os cintos porque não há piloto”. Esse será o mais novo gargalo que se projeta para os usuários do transporte aéreo comercial no Brasil, caso o país não implemente uma política de formação de mão de obra especializada agora como prioridade para o setor aéreo brasileiro. A escassez de comandantes e copilotos poderá radicalizar-se ainda mais com a expansão do transporte de passageiros nas rotas domésticas, a inevitável regionalização e a chegada de outras empresas em operação.

    O número de passageiros transportados no primeiro semestre deste ano foi 21,39% maior em comparação ao mesmo período do ano passado, conforme o relatório Dados Comparativos Avançados, produzido pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Apenas em junho deste ano, a agência reguladora registrou neste segmento um aumento de 19,54% em relação ao mesmo mês de 2010. Nos 12 meses do ano passado, o volume de passageiros cresceu 22% no Brasil.

    Há ainda uma demanda urgente por pilotos para atender o setor de táxi aéreo crescente. (Leia no boxe na página 11)

    A disputa ainda é travada nos bastidores por empresas, governo, sindicatos e a Anac, porém será o usuário que pagará a conta dos transtornos recorrentes quando opta pelo avião para se deslocar.

    A Organização Internacional de Aviação Civil (Icao) projeta que o boom da aviação comercial no mundo exigirá a formação de mais de 517 mil pilotos no mundo, até 2030. Dados do mercado de trabalho brasileiro estimam um crescimento de 23% no número de pilotos contratados no ano passado pelas companhias aéreas nacionais. Passados oito meses de 2011, a Anac, por intermédio de sua assessoria de imprensa, revela que não tem previsão de quando lançará o edital deste ano para a seleção de concessão de bolsas para formação de pilotos.

    A preparação de um profissional para adentrar a uma empresa comercial na condição inicial de copiloto exige tempo e muito investimento. Até que o profissional atinja o estágio para se sentar do lado esquerdo na cabine de comando, na condição de comandante, há um longo percurso.

    O coordenador de cursos teóricos do Aeroclube de Bauru e instrutor de voo Adilson Ferreira da Silva avalia que, realmente, faltam pilotos para as companhias de aviação por negligência nos investimentos no passado. Ele projeta que as empresas contratam copilotos iniciais com experiência de voo de 600 horas a 1.500 horas. Silva explica que a companhia passará a treinar este profissional para transformá-lo em um comandante em um prazo de 3 a 5 anos. “Se quiser um comandante pronto para assumir, esse falta”, destaca Silva. Ele acredita que, num prazo de três a quatro anos, o mercado será suprido com o pessoal em formação atualmente.

    O especialista na formação de profissionais Edson Mitsuya, coordenador do curso de Ciências Aeronáuticas ITE - Centro Universitário de Bauru, destaca que é exceção um profissional que era comandante em uma companhia chegar em outra empresa assumindo a condição de comando. “Ele vai fazer parte de um processo de treinamento e readaptação para a nova filosofia dessa companhia. Não vai automaticamente sentar na esquerda e sair voando”, destaca. Mitsuya lembra que está em jogo para a empresa aérea a responsabilidade com a vida de passageiros, além do bem material de uma aeronave Boeing 737 ou um Airbus 320 custando de US$ 50 milhões a US$ 60 milhões.

    Mitsuya cita que a Anac precisa informar quantos profissionais formados a cada ano no País realmente chegam à aviação comercial. O especialista cita o dado abrangente de formação de 500 pilotos anualmente informado pela Anac. “Aqueles que chegam na porta da companhia não chegam a 100. O piloto comercial que vai trabalhar profissionalmente, eles (Anac) não divulgam”, questiona Mitsuya Mitsuya. Ele argumenta que do total de formados no Brasil parte é piloto de planador, parte é piloto privado e há outras modalidades.


    Gargalos

    A expressão “gargalo” popularizou-se há uma década no Brasil como síntese para a falta de investimento e de planejamento que se combinam para impedir o desenvolvimento socioeconômico em diversos segmentos. Gargalo no segmento de transporte aéreo, principalmente, o de passageiros é algo comum com aeroportos sem condições de atender a demanda, faltando até esteira rolante para liberação de bagagens.

    Outra questão prática citada por Mitsuya é o gargalo no simulador de uma grande companhia aérea brasileira que investe para especializar seus pilotos. O coordenador do curso da ITE explica que um ex-aluno relatou estar contratado há quatro meses e não realizou sequer uma hora de voo, porque não consegue avançar na fila do simulador de treinamento. A solução rápida é o profissional fazer o treinamento nos Estados Unidos, França ou Inglaterra. Piloto parado implica, para a empresa em despesa e para o profissional rendimento menor no final do mês no holerite. Voando, o piloto pode até quadruplicar seus vencimentos recebendo horas de voo e em terra firma o profissional recebe apenas o piso básico.

    O coordenador de cursos teóricos do Aeroclube de Bauru e instrutor de voo Adilson Ferreira da Silva destaca a falta de investimentos em infraestrutura aeroportuária também como restrição na formação de pilotos. Ele comenta que o Aeroclube de São Paulo tem o mesmo problema por não conseguir atender com fluidez a demanda por pessoas procurando aulas práticas. Conforme Silva, os alunos não conseguem agendar mais do que uma hora por semana porque não há instrutores e aeronaves disponíveis. “De tanta gente que está voando. A gente percebe que isso vai pesando”, avalia.


    Polêmica da reserva de mercado


    O Código Brasileiro de Aeronáutica define que não se pode contratar pilotos estrangeiros para atuarem no Brasil e somente autoriza a contratação de mão de obra estrangeira em casos excepcionais, como para treinamento e com permanência de no máximo de seis meses.

    A reserva de mercado para pilotos brasileiros é tratada com muito cuidado e, por isso, é alvo de grande interesse e disputas exatamente em um momento em que se discute o argumento da falta de profissionais. Desde 2009, tramita na Câmara Federal uma proposta de modificação do Código de Aeronáutica para possibilitar a contratação de estrangeiros por até cinco anos.

    O coordenador do curso de Ciências Aeronáuticas ITE-Centro Universitário de Bauru, Edson Mitsuya, entende que não há necessidade de manutenção de reserva de mercado. No entanto, Mitsuya, desconfia da qualidade do piloto estrangeiro que virá atuar no Brasil.

    Ele argumenta que a remuneração atual dos brasileiros é atraente, porém ainda insuficiente para seduzir os pilotos brasileiros que deixaram o País com o fechamento da Vasp, Varing, Transbrasil, Rio Sul e Nordeste. Há uma projeção de 650 pilotos brasileiros voando para companhias internacionais e que poderiam voltar. Contudo, Mitsuya avalia que boa parte não tem interesse de retornar devido à condição financeira melhor e tratamento das companhias internacionais.

    Para o especialista, a abertura aos estrangeiros só é interessante se for para elevar o nível técnico e de segurança no Brasil. “Não é que eu seja contra. Que venha com nível de qualificação igual o melhor que o nosso pessoal. Mas a probabilidade desse pessoal que vem e que eu enxergo são pessoas menos qualificadas que as nossas”, alerta Mitsuya.

    O coordenador do curso de Ciências Aeronáuticas ITE-Centro Universitário de Bauru, Edson Mitsuya, cita também o problema da pressão para aumento salarial acirrando a disputa das empresas por profissionais. “Na pressão dos pilotos ou através do sindicato, aconteceu aqui com um comandante saindo de uma empresa e indo para outra porque o salário era melhor. Depois oferecia e o cara voltava. Para falar o português claro: ‘é o cara vulgarizar o trabalho do profissional’”, define.

    O coordenador Adilson Ferreira entende que é desnecessário mudar a legislação. Ele sugere que possa ser uma concorrência para baixar salários no mercado interno.

     

     

    Terra Noticias
    04/09/2011

    Empresas vão às universidades atrás de novos pilotos

    Uma boa notícia para quem pensa em concretizar o sonho de trabalhar a milhares de metros do chão: o mundo está precisando de mais pilotos e profissionais da aviação. Os pré-requisitos, contudo, estão mais altos. Ainda que não seja necessário ter uma formação superior, as empresas têm buscado nas graduações pessoas com uma habilitação mais completa para comandarem suas aeronaves.

    Com o aquecimento da economia, cresceu o número de brasileiros que podem comprar uma passagem de avião: em 2010, foram cerca de 74 milhões de embarques, 22% a mais do que no ano anterior. Isso e a perspectiva de curto prazo no País - com a realização da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada de 2016 - levam as grandes companhias a escancararem as portas para os novos profissionais saídos da faculdade.

    De acordo com Hildebrando Hoffmann, coordenador do curso de Ciências Aeronáuticas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), cerca de 60 vagas são abertas por semestre e a grande maioria dos formandos vai para a pilotagem. Apesar de já ser um número expressivo, Hoffmann acredita que ainda há espaço para expansão. O coordenador-geral do curso de Ciências Aeronáuticas da PUC-GO, Raul Francé, completa: "as 23 faculdades do Brasil não estão dando conta. Existem mais aviões entrando no mercado do que as escolas estão conseguindo suprir".

    Na Universidade Anhembi Morumbi de São Paulo, o curso de Aviação Civil está em segundo lugar na lista dos mais procurados. Para Edson Gaspar, coordenador da faculdade, é mais um reflexo do mercado, que vê a população ter cada vez mais acesso às passagens aéreas. "Isso causa a expansão das empresas, que adquirem mais aviões e aumentam a malha de atuação no País", salienta.

    Demanda antiga
    Criado em 1993, o curso de Ciências Aeronáuticas da PUCRS foi um dos pioneiros no País. Motivada por uma demanda da extinta Varig, que na época estava em franco desenvolvimento e necessitava melhorar a qualificação dos seus profissionais, a instituição investiu na área.

    Ao longo dos três anos de curso, os alunos não são preparados apenas para serem pilotos, mas também para atuarem em outras áreas. As matérias são dividas em três grupos: aviação, que tem disciplinas como teorias de voo, motores aeronáuticos, manutenção e sistema de aeronaves; gestão, que lida com organização do transporte aéreo, legislação da profissão, segurança e também sobrevivência.

    A última parte é a prática. O estudante deve cumprir 165 horas de voos simulados e mais 160 horas de voo real. Para André Boff, 30 anos, que se formou em 2006 pela PUCRS e atualmente é co-piloto da companhia Azul Linhas Aéreas, esses são "os melhores momentos, horas que literalmente voam".

    Boff acredita que ser piloto é uma oportunidade única: "é um desafio ter um equipamento altamente complexo sobre o seu controle", destaca.

    Antes de ingressar no curso, contudo, é preciso preencher alguns requisitos. "O aluno que entra precisa passar no vestibular, ter mais de 17 anos, devido a uma determinação da Agência Nacional de Aviação (ANAC), e também já ter voado mais de 25 horas", relata Hoffmann.

    Brincadeira do videogame virou profissão
    "Desde criança, meus brinquedos favoritos eram aviões". Essa frase remete ao começo do fascínio de Rodrigo Coelho pela aviação. Hoje, aos 31 anos, ele viu seu sonho virar realidade, pois é co-piloto da Gol Linhas Aéreas.

    Coelho conta que esse interesse diminuiu aos 14 anos, quando ele só pensava em jogar basquete. Mas a fixação voltou quando o irmão comprou o game Microsoft Flight Simulator, em que é possível simular um voo real na tela do computador. "Vendo meu irmão e seus amigos jogarem, percebi que isto seria um desafio interessante. E, de repente, todo o encanto com a aviação voltou. Comecei a me interessar por mecânica, aerodinâmica, meteorologia e toda ciência ligada à aviação. Além, é claro, da pilotagem, que eu via como uma paixão e uma técnica a ser aprimorada a cada dia, de forma viciante", relata Rodrigo.

    O piloto acredita que, para a pessoa realmente saber se esse é o curso que deve seguir, é preciso que se informe o máximo possível, visite um aeroclube e também faça um voo experimental. Para ele, a profissão será cada vez mais vital. "Acredito que a humanidade dependente da aviação como um meio de transporte rápido, seguro e eficaz, de tal forma que sempre existirá oportunidades para quem quiser começar", salienta.

     

     


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